Desde muito miúda que acompanhei os meus pais nas suas idas diárias a um lugar de ‘culto’ no Porto. Nunca lhe chamaram religião, mas filosofia. O Racionalismo Cristão. Como o próprio nome indica, razão e princípios crísticos.
Cresci envolvida em práticas e conceitos incomuns para a época, tais como : espírito, reencarnação, água fluídica, forças inferiores e superiores, corrente, médium, outras vidas, mediúnidade, obcessores (não era este o nome dado, mas não me recordo qual era) ,vida fora da matéria, etc.
E se nunca me fez mal nenhum essa convivência chegada, (e só recentemente percebi o real e lato impacto que tivera na minha vida..) antes me familiarizou com temas e realidades além das ditas comuns e normais, a verdade é que cedo percebi também que não me chegava, por muitos princípios que me diziam, não dava resposta a todas as questões que tinha nem se identificava totalmente comigo.
Por opções de educação, cresci e aprendi em dois colégios católicos, por isso sei por dentro das práticas e realidades desta religião. A infância, passou-se num espaço privilegiado, belo que guardo nas minhas melhores memórias: Chamava-se a Quinta das freiras, ou quinta da Azenha, melhor dizendo o Externato Santa Margarida. Aí fiz a primeira e única comunhão. Apesar de não ter nenhuma prática católica em casa, seguia os ‘trâmites’ impostos pela escola adotada, como se fossem meus. Era estranha esta coexistência. Ser socialmente a nível escolar de uma forma e viver outra. Era uma máscara que tinha que usar.
Lembro-me do choque que foi passar deste belo (além de uma enorme área verde envolvente, tem, ou tinha, uma igreja linda, toda em granito, pé direito altíssimo e despojada, com eu gosto..) e enorme lugar em Gondomar, para um quarto de espaço(será dizer pouco), com o quíntuplo ou mais de alunos no Porto(será dizer pouco!), o C. Luso-Francês. Senti-me mal..andar de cavalo para burro. Burro manco, feio, atrofiado e infeliz.
Lembro-me também de ser obrigada a ir à missa lá, e da ansiedade de ter de magicar pecados sempre que era obrigada a ir ao confesso. Diacho, ao que uma pessoa se sujeita.
E a bonomia e placidez das primeiras freiras, passou para o sarcasmo, rigidez, atrofia e maldade de muitas das segundas. Lembro-me de duas espectaculares que escapavam à regra geral, e se destacavam das demais: a professora de Português e a de Biologia.
Mas afasto-me do que me propus.
O que quero dizer com isto é que convivi de perto com duas práticas metafísicas enquanto me ia formando como gente. E por que nenhuma me encheu as medidas, não fiquei por ali.
Não vou fazer aqui uma resenha das minhas experiências, porque não interessa fazê-lo.
Durante algum tempo queixei-me (aos meus botões) desta minha incapacidade de me fixar a uma religião/filosofia, porque sentia a necessidade, de alguma disciplina e rigor, de algum método e ritual que me obrigasse a uma maior focalização e consequentemente menor dispersão, naquilo que chamo na minha vida de ‘inconsequência’. Sentia-me um pouco perdida neste imenso mar de apelos e vias, e ser capitão do meu pequeno barco a remos, parecia uma tarefa de gigante. Ter alguém que me disse-se: levanta-te às tantas, reza às tantas, diz isto tantas vezes, faz aquilo, às tantas e x vezes, … parecia-me mais ‘fácil’, ou pelo menos, indispensável para me centrar objectivamente.
O problema é que nunca encontrei nada nem ninguém que ( e voltamos ao mesmo) ‘me enchesse as medidas’. As minhas são de outra dimensão e exigência, parece-me. São as minhas e pronto, está tudo dito. E por isso fui absorvendo, aprendendo, conceitos, normas, ideias daqui e dali*, que ressoavam com a minha maneira pessoal de ser e sentir e me faziam sentido, sem me fixar em nenhuma religião, filosofia, guru, mestre, seita, dogma, onda, credo,…
E o mundo está cheio de grandes exemplos, humanistas, filósofos, pensadores, religiosos, e outros (todos) comuns mortais capazes de nos emocionar, enlevar, ensinar, despertar, influenciar, cativar, …, na nossa demanda pessoal de vida.
Para mim, fixar-me e seguir um deles, por mais iluminado que me possa parecer, é-me demasiado redutor e limitativo. Além de poder ser, muito perigoso..
O mundo está cansado de tanto fundamentalismo, tanto dogma e fervor cego em torno das religiões, das sociedades, no mais comum quotidiano.
Quando deixamos de pensar pela nossa cabeça para seguir a cabeça de outro, alienamos o nosso direito e dever fundamental de sentir, pensar e agir por nós mesmos. Transferimos o poder que temos para o outro. E tentamos assim também destituirmo-nos de responsabilidade por aquilo que fazemos..
Uma vez vi num blog, uma coisa que achei graça. O título da famosa lista de seguidores dizia: ‘podem seguir-me, mas eu também estou perdido’. Ora eu não estou perdida (de vez em quando vou me perdendo, mas recentemente, encontrei-me :), daí a falha na lista de seguidores ;)
Alguém espiritual dizia numa informal e divertida exposição acerca de viagens, que Viajar (e tratava-se de uma volta ao mundo) era também uma incapacidade de Ficar. Nomadismo versus Sedentarismo.
Pois para mim, parece-me que não ter religião nenhuma também é (a minha) incapacidade de a ter.
Entre um pássaro na mão e outro a voar..deixo sempre os dois voarem. Se quiserem. :)
Fiquem bem, com ou sem religião. *(Cristianismo, Taoísmo, Budismo, Hinduísmo, Xamanismo, Zen, ..)
Joan Osborne - What If God Was One Of Us
Enviado por Pippo-el-peco. - Vídeos de notícias do mundo inteiro.
1 comentário:
(não sei porquê, mas os comentários não aparecem onde era suposto.)Obrigada.
Anónimo deixou um novo comentário na sua mensagem "Está explicado: in capacidade":
Análise palpitante neste espaço, tópicos como aqui vemos dão brilho aos que reflectir neste blog !!!
Dá muito mais do teu sítio, aos teus utilizadores.
Publicada por Anónimo em Hatha a Fevereiro 19, 2011
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